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Foto do escritorMara Tribuna

A rádio universitária é “o coração da rádio”

As rádios universitárias são plataformas de lançamento para os estudantes que nelas participam. Extintas ou ainda atuais, no online ou no fm, as rádios universitárias condensam em si a essência da própria rádio.

Estúdio da Engenharia Rádio, uma rádio universitária no Porto | Inês Moura Pinto

Precária, resiliente e necessária. É assim que Jason Loviglio, professor da Universidade de Maryland, dos Estados Unidos, descreve a rádio universitária. Loviglio, que estuda e investiga a história dos media e da rádio, esteve na Reitoria da Universidade do Porto para falar sobre a importância deste tipo de rádios.


Jason Loviglio conta ao público que a rádio que orientava na sua universidade, a WMBC, fechou devido à falta de financiamento. No entanto, acredita que se vai “erguer das cinzas como uma fénix” e é através deste exemplo que o professor norte-americano explica a precariedade das rádios universitárias: “são efémeras, porque dependem dos estudantes e de fundos monetários”.


Exemplo disso é também a RUP, Rádio Universitária do Porto, que começou as primeiras emissões em 1986, inicialmente na Faculdade de Ciências da UP. Com o crescimento do projeto, a RUP acabou por passar para a Rua Miguel Bombarda, como resultado da falta de condições do estúdio e das limitações do acesso ao edifício. No entanto, e por não ter licença, a RUP acabou por fechar passados dois anos, em 1988, com a nova Lei da Rádio.


A verdade é que o encerramento não é algo exclusivo nem da WMBC, nem da RUP: é uma realidade comum nas rádios universitárias. Consideradas como acessórias nos orçamentos das instituições, muitas emissoras viram-se obrigadas a vender as suas licenças. Mas se, por um lado, a efemeridade é uma das caraterísticas associadas a este tipo de rádios, por outro, a resiliência também a é.


Precárias e resilientes


Apesar de precárias, muitas acabam por ser reativadas. A Engenharia Rádio (ER) é prova viva dessa resiliência: surgiu no final dos anos 90, na Faculdade de Engenharia, como uma rádio interna para uma sala de convívio, tal como explica Filipe Teixeira, coordenador-geral. Em declarações ao Prisma, Filipe conta que “na altura, a RUP já não existia, então a Engenharia Rádio era o único projeto musical e de entretenimento que havia”. No entanto, com a mudança da Rua dos Bragas para o pólo da Asprela, a rádio ficou suspensa.

Filipe Teixeira é o coordenador-geral da Engenharia Rádio | Inês Moura Pinto

Foi então que no final da primeira década de 2000, um dos projetos da Associação de

Estudantes, que previa a reativação da ER, foi posto em prática pela mão de Filipe Teixeira, Miguel Heleno e a restante direção da altura. Assim, apesar de precárias, muitas rádios acabam por ser reativadas graças à sua resiliência. A Engenharia Rádio voltou a surgiu, desta vez como projeto exclusivamente online.


Filipe Teixeira conta ainda as primeiras experiências da ER. “A nossa primeira grelha, em março de 2007, tinha 12 programas e nunca ninguém tinha feito rádio, portanto, foi tudo uma aprendizagem. Tentámos procurar o que é que as outras rádios online também faziam, qual era o formato dos programas que nós queríamos fazer, que tipos de programas queríamos – mais entretenimento ou mais informação – e tentámos, em conjunto, criar um projeto que fizesse sentido”.


Plataformas de lançamento que crescem


As rádios universitárias são, sem dúvida, “um local seguro onde se pode aprender, cometer erros, experimentar e iniciar-se na área”, tal como refere Jason Loviglio. Por isso, o professor da Universidade de Maryland compara as rádios universitárias a “plataformas de lançamento”. A experiência e a aprendizagem são fatores que não podemos dissociar deste tipo de projetos e, por este motivo, as rádios tornam-se também necessárias e úteis para os estudantes.


Em Portugal, destacam-se ainda a Rádio Universitária de Coimbra (RUC), fundada em 1986, a Rádio Universitária do Minho (RUM), em 1989, e a Rádio Universitária do Algarve (RUA), criada em 2002. Resistiram ao longo dos anos e atualmente ainda emitem, nas frequências 107.9 FM, 97.5 FM, e 102.7 FM, respetivamente. São rádios que, apesar de universitárias, ganharam espaço a nível regional e já não são apenas para estudantes.


Para Jason Loviglio, a rádio universitária condensa toda a essência da rádio, sendo “uma versão mais exagerada de tudo o que ela sempre foi”. “A rádio universitária, tal como a própria rádio, procura imaginar uma comunidade que não consegue ver. O ato de falar a um microfone, de entrar no ar, é um ato de fé. É falar a uma audiência invisível, na esperança de que haja uma audiência”, revela. Por isso, Loviglio afirma que “a rádio universitária é o coração da rádio”.

Jason Loviglio na Casa Comum da Reitoria da Universidade do Porto | Adriana Peixoto

O que reserva o futuro?


No entanto, esta essência é muitas vezes questionada quando se passa do sinal FM para o online. Com a internet, é possível transmitir para todo o mundo, mas Jason Loviglio realça o valor do tempo e a simultaneidade no ato de escutar: “qual é o valor de ouvir alguma coisa e saber que mais pessoas estão a ouvir a mesma coisa ao mesmo tempo? A simultaneidade cria um sentimento de comunidade”, reflete.


Mas talvez seja possível ter-se o melhor de dois mundos: o projeto “Radio Garden” quer trazer de volta a magia do sinal FM com um toque moderno. Criado pelos académicos do Netherlands Institute for Sound and Vision, pretende passar “o sentimento da rádio”, aliando a nostálgica imprecisão do botão giratório do sinal analógico ao alcance global da internet. “Radio Garden” é uma plataforma online que nos permite ter acesso a rádios literalmente de todo o globo, através de simples cliques.


A Engenharia Rádio está inclusivamente neste projeto. Uma das vantagens da presença online é precisamente a capacidade de alcance que o sinal FM não permite. “Temos cada vez mais pessoas a ouvir, até fora de Portugal. Há alguns podcasts que conseguimos perceber que temos centenas de pessoas a ouvir no México”, conta Filipe Teixeira, coordenador-geral do projeto.


Ao longo do tempo, a rádio tem recebido ameaças constantes no que toca à sua sobrevivência: “a rádio está sempre prestes a ser considerada extinta”, mas o professor e investigador norte-americano não acredita na sua “sentença de morte”.


Este artigo foi produzido em colaboração com Adriana Peixoto.




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